terça-feira, 6 de setembro de 2011

A emancipação de Valmyr Melancolia

Escutar “Trejeito”, o novo CD de Valmyr de Oliveira, nosso eterno Valmyr Melancolia, me leva à Janaúba de 25 anos atrás, com suas ruas tranquilas, aquele jeito vagabundo dos viventes, Xiba num canto da praça, perto do BMG.
Escutar “Acorda”, do Jorge Takahashi, me leva de volta ao Festijan – o Festival da Canção de Janaúba, realizado naquele longínquo julho de 1986. E me traz ótimas recordações.
Afinal, entre um cam®inho e outro, há muita coisa para se fazer naquela cidade gorutubana. A região me mostrou paraísos ecológicos, como as praias de Barreiro da Raiz, o lago do Bico da Pedra, a serra do Talhado, Serra Branca, onde a Globo filmou “Grande Sertão”, a cachoeira do Serrado, que serra a montanha. Durante o passeio, pode-se suspirar a vontade, seja pelo amor, seja para recuperar o fôlego. Pode-se curtir o pôr do sol romanticamente no pico da serra onde estão instaladas as torres de TV, e de onde a vista alcança até Montes Claros. Ou pode-se, simplesmente, ouvir música. Da boa!
E a música de Valmyr Melancolia encanta pela simplicidade. Não chega a ser uma obra-prima, mas mostra que o artista continua em boa forma, com seu rigor estético e com frescor de iniciante, mesmo aos 50 e poucos anos. Ele conta histórias, articula, ironiza... Tudo com poesia, escrita ou musical.
Sem ser especialmente inovador, o CD traz o que Melancolia sabe fazer de melhor, em dois lados. O “A” - Trilhas do Tempo -, composições suas e com/de amigos Jorge Takahashi, Arlen Azevedo e Georgino Junior. E o lado “B” – Trejeitos -, sua parte instrumental afiada. Melodias agradáveis que matam qualquer sede por melodias.
Takahashi continua o velho urso em letras poéticas. A sua veia lírica aparece em muitas faixas, como “Trilha do Tempo” - solos na vida/ presos no tempo/ estamos sempre a procurar. Muita coisa inspirada na música negra brasileira, no clube da esquina, no jazz e rhythmm´blues. Não tem nada a ver com o cenário bunda-mole da música brasileira atual. Na verdade, o CD é música. Todo música.
Particularmente “Acorda”, que me levou aos anos 1980 naquela cidade gorutubana. A canção ficou em segundo lugar no Festival – perdeu para uma música de protesto que veio dos lados de Belzonte. Nunca havia sido gravada, mas eu sempre a escutava – tenho o Festival ainda hoje gravado, em fita k7 - transferida depois para uma fita magnética 226, da Scotch. Já é hora de transformar aquele festival em CD...
E mais um que foi/ Sem a terra, sem país/ Sem bandeira, sem raiz/ Por mais uma vez... Vem acorda desse laço, desse nó/ Mas não chora não/ Velha morta cicatriz...
O som mais Montes Claros vem na gostosa “Catopelando”, de Valmyr e Georgino Junior. Ali aparecem as cores e os cantantes de agosto, a homenagem a Miguel Sapateiro, Mestre Zanza, José Carroceiro - São Serafins, são os Joãos/ É tanto rosto sem nome/ Debaixo desses penachos. Coisa de gente festeira, coisa de povo surrado, que se liberta, alforria, num cantar meio folk.
Coisa boa quando temos tanta coisa ruim tocando nos rádios. Está na hora de se libertar, alforriar nossa música.
Onde foi parar aquela canção do Roberto? Aquelas guitarras distorcidas dos festivais de MPB? Aquele “Baby” dos Mutantes? A “BR 3” de Toni Tornado? Raul Seixas e seu “Medo da Chuva”? Ney e a “Rosa de Hiroshima”, Rita Lee e essa “Mania de Você”? Chico Science, Raimundos, Marcelo D2, Charlie Brow Jr, Skank? Cadê a cadencia do samba? Será que não temos substitutos para o Ultraje a Rigor, Paralamas, Titãs, Legião Urbana?
A música brasileira ultimamente esta entre o bom ou ruim?
Sei que é raro escutar a música popular de hoje e encontrar coisas que surpreendam. Acredito estar havendo uma grande transformação, sobre a qual não sabemos nada.
E não vejo uma reflexão sobre isto.
Tenho acompanhado – e sendo influenciado – pela rock da era Beatles, da bossa nova, jovem guarda, tropicália, do rock setentista, psicodélico, do pop dos anos 80, 90, 2.000, dois mil e um, dois mil e dois, tal qual o Expresso do Gil.
Hoje, me surpreendo com tanta canção bunda-mole, e que faz sucesso.
É como diz José Wilker no CD do Melancolia: o menino vai, pequeno como as pedras miúdas na beira do rio.
Tomara que outros sigam seu exemplo.

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