domingo, 21 de novembro de 2010

O sertão de Cícero Billie Joe

Escutando novamente o CD do amigo velho Cícero Billie Alves (Volume III – Os Originais não se Desoriginalizam) pode-se comprovar que o velho roqueiro não perdeu a ternura, mesmo rolando por pedras tão estranhas, como estas que se encontram nas areias do Rio Gorutuba.
Afinal de contas, e posso falar de cadeira, o Vale do Gorutuba - que faz parte do Vale do Verde Grande – oferece sotaques, costumes e manifestações artísticas das mais diversas, o que o transforma o lugar em um grande caldeirão efervescente de cultura.
Rapidamente podemos lembrar além da diversidade de Cícero, dos magistrais Beija Flor, com sua tessitura narrativa, mostradas em canções com ‘Gameleira‘ e ‘A Bala de Ouro’ (esta gravada com Téo Azevedo), Carlito com seu canto renascentista, revelador e tristonho, mostrando as auguras do rio e do povo, do trio Canto Livre formado por Bha, Delvi e Tino, de Beira Mar, Jackson Antunes, Paulinho Pintor, Zé Mineiro, Gio e Géo, Decão e tantos mais.
Está faltando realizar-se em Janaúba um Fórum Cultural, o que serviria para afirmar o valor da arte independente e espontânea que nasce nas ruas e vielas da cidade, buscando mais ainda o que existe nos guetos do vale. Pode ser uma valiosa ferramenta para o desenvolvimento cultural desta região norte-mineira, incentivando o resgate de identidades culturais. Mas isto é problema para o Arnaldo Pereira resolver pro ano. O nosso...
O nosso é falar da batida agressiva do rock‘n‘roll do Billie Alves, que se mistura ao forró pé-de-serra e a música caipira dos brejos. Para ele, a inspiração é a mesma. Com vários discos independentes – um, de forró, não lançado comercialmente –, sua arte começa a cair no gosto dos formadores de opinião, embora seja um dos maiores vendedores individuais de CDs independentes desse norte-mineiro. Só com seu primeiro CD, ele tirou quatro edições. Menino levado das barrancas do Gorutuba, acostumado com estiagens e enchentes do córrego-rio, colocou debaixo do braço o álbum e caiu no bengo. Vendeu, gastou, fez outros... Divertiu-se o moleque Billie muito mais em cima do palco, do que nós apreciando suas músicas na platéia. Ou o contrário... Sei que todos se divertem.
Cícero Billie Alves é um caso paradigmático, poeta da prosa, e um místico personagem do Vale que vai encantando e espantando a todos com suas formas narrativas. Elas extrapolam a mera classificação de música. Este CD, por exemplo, mistura recursos eletrônicos a uma base instrumental executada com competência, sem jamais perder a melodia de vista. Nele tem experimentação, baladas com belos vocais e rock do bom. Mas o moleque Billie é assim: capaz de ir a um evento em Belo Horizonte ou Almenara, levando na bolsa seu CD independente para distribuir. E assim a vida segue.
Afinado e cheio de estilos, ele interpreta suas canções - como Canção do Sofrê, a mais conhecida, mas nem por isso uma das melhores - atraindo os bons espíritos. E cria um universo no sertão em nossa cabeça, com narrativas e histórias naquela literatura sertaneja. O sertão que Billie - apelido que ganhou por causa de suas interpretações rockianas -, constrói, não se alimenta dos livros que leu, nem de um conhecimento prévio da vida do interior. É ligado às memórias da infância. É ligado ao momento atual. Ele sempre viveu como um morador do campo. Se ela, a inspiração, vem em ritmo mais quente do rock, mais critico do blues ou mais terno, da nossa música sertaneja, não tem problema. Ele vê nossa terra como poeta, da poesia das paisagens e lugares.
Só falta mesmo penetrar na alma de seus personagens.
Mais ainda...

Nenhum comentário:

Postar um comentário